Normalmente não faço análises deste tipo aqui no blog. Prefiro realmente tratar de aspectos técnicos da criação e da validação estatística de trading systems. Acho o assunto bem mais prazeroso, é bem verdade.
Mas o fato é que alguns amigos e alunos têm me perguntado muito a respeito do real impacto dos governos petistas sobre o valor de mercado da Petrobrás. Ao ponto de eu chegar à conclusão de que um artigo sobre o assunto seria algo interessante de ser escrito.
Confesso que foi um belo passa-tempo levantar estes dados aqui neste post e desde já deixo claro que a análise aqui apresentada é simplista, na medida em que apenas considera a variação percentual dos valores das ações ordinárias e preferenciais da Petrobrás na BOVESPA durante o período dos últimos 20 anos. Uma análise mais detalhada dos fundamentos da empresa poderia chegar a resultados diferentes dos aqui apresentados, apesar de que minha sensação é a de que estes outros resultados seriam provavelmente ainda mais arrasadores (pois não considero aqui a grave situação de endividamento atual da empresa — apenas percebo o efeito indireto da mesma sobre os preços das ações).
Mesmo assim, em se tratando de uma análise superficial, acho que os argumentos aqui apresentados permitem dar uma boa dimensão da realidade da maior estatal brasileira hoje em dia.
Então vamos lá…
A análise mais simplista seria avaliar o preço das ações em 2002 (início do primeiro governo Lula) e comparar com o preço das mesmas agora em Junho de 2016, quando do afastamento da Presidente Dilma Roussef. Neste caso, teríamos este resultado:
2002 | Jun2016 | |
PETR3 | 4,03 | 10,15 |
PETR4 | 3,57 | 8,09 |
À primeira vista, e considerando apenas a valorização das ações, poderíamos concluir que a empresa prosperou sob o governo petista. A figura parece até bonita deste ângulo, eu devo admitir. 🙂
Mas a realidade é bem mais complicada. E a figura real, bem mais feia do que parece…
O primeiro passo que tomei para aprofundar o estudo foi levantar em mais detalhe o histórico de evolução dos preços da PETR3 (ordinária) e da PETR4 (preferencial) nos anos de 1998 a 2016. Abaixo mostro os gráficos de ambas (em escala semilog e com dados obtidos da BMFBOVESPA através da ferramenta gratuita GrapherOC) já marcados com os principais eventos de interesse neste período.
Fig.1 – PETR3: 1998 a 2016
Fig.2 – PETR4: 1998 a 2016
Ambos os gráficos são bastante correlacionados em suas trajetórias, como era de se esperar. Em 1998 vemos uma forte queda nas ações da empresa devido à crise internacional ocasionada pelo calote da Rússia. Em 2002 tivemos uma ocorrência análoga, desta vez devido ao calote da Argentina.
A estas quedas, segue-se um período de magnífica alta (de impressionantes 1480%) de 2002 a 2008. Podemos debater as causas dessa alta, mas o fato é que o tripé macroeconômico herdado do governo anterior foi mantido pelo primeiro governo Lula e o mundo assistiu a uma fantástica alta dos preços das commodities nos mercados globais. Neste mesmo período, a USIM5 subiu mais de 4000 % (tenho boas lembranças dessa época… ;)).
O preço do petróleo nos mercados internacionais disparou mais de 400 %, conforme podemos ver na figura 3, abaixo.
Fig.3 – Crude Oil: 1998 a 2016
Em seguida tivemos a crise originada pelo problema do subprime em 2008. Nesta crise, as ações da estatal caíram cerca de 70%, mas se recuperaram em 2009, uma vez que os preços do petróleo também voltaram a subir.
O efeito realmente danoso da política econômica do PT começou a se manifestar em 2009. Ao final deste ano, o governo federal patrocinou a mudança no modelo de exploração de petróleo. Seja por motivações ideológicas ou eleitorais, o fato é que o impacto da mudança hoje pode ser admirado em todo o seu “esplendor”. (É claro que estou sendo ácido — quem me conhece sabe que critico esta idéia desde a sua concepção. Era a crônica da tragédia anunciada).
As figuras 1, 2 e 3 demonstram que, após Dez09, com a mudança nas regras, as ações da estatal começaram a cair drasticamente, apesar dos preços do petróleo continuarem a subir no mercado internacional. O mercado financeiro e os investidores absorveram muito mal as medidas petistas e em 2014 já havia uma crise de credibilidade em relação ao poder executivo nacional. Tanto que as ações respiraram em alta às vésperas das eleições presidenciais com uma eventual probabilidade de saída do PT do poder. E isso ocorreu ao mesmo tempo em que os preços do petróleo começavam a cair lá fora!
Com a reeleição de Dilma, as ações mergulharam em uma queda vertiginosa. O que falava mais alto era mesmo a descrença na condução da economia e os indícios de escândalos de corrupção na estatal. Houve uma alta pontual que coincide com a constatação de que a popularidade de Dilma desabava (manifestações populares a partir de Mar15).
De qualquer forma, os preços da Petrobrás só voltaram a subir a partir de Dez15. E sua alta pode ser atribuída tanto ao início do processo de impeachment quanto à recuperação dos preços internacionais do petróleo. Pelo menos, é isso que os gráficos nos dizem…
Com base no exposto, concluo que, se quisermos avaliar o impacto das políticas petistas sobre a saúde da Petrobrás, o razoável é que consideremos a diferença de preços das ações no período que vai de Dez09 (mudança do modelo de exploração) até Jun16 (afastamento de Dilma Roussef). Isso, obviamente, considerando o enfoque simplista de nossa análise meramente voltada aos preços das ações.
Neste caso, o cenário é outro:
Dez09 | Jun16 | |
PETR3 | 36,61 | 10,15 |
PETR4 | 30,41 | 8,09 |
Trata-se de uma desvalorização de, por baixo, pelo menos 70% no valor das ações no mercado. Ora, a composição acionária da empresa em 2014 era conforme a apresentada na figura 4 abaixo.
Fig.4 – Composição acionária em 2014 (Fonte: BMFBOVESPA)
Por simplicidade, vamos assumir que esta composição acionária se manteve constante. Neste caso, a tabela abaixo (figura 5) mostra claramente o tamanho da devastação:
Fig.5 – O tamanho da perda
Com esta análise simplista, chegamos a uma perda de R$ 321 bilhões de reais. Este seria o tamanho aproximado do “custo PT”, caso a empresa não tivesse ainda que arcar com dívidas bilionárias e alguns processos judiciais aqui e nos EUA. Ou seja, o buraco real deve ser ainda maior.
Mesmo com todas as imprecisões do método de análise aqui adotado, dá pra perceber que a coisa foi realmente muito séria. Espero que este artigo aqui venha a servir como um singelo indicativo do que aconteceu com a Petrobrás (e, por consequência indireta, com o mercado financeiro brasileiro) e do que pode acontecer quando populismo e ideologia se sobrepõem à correção e ao bom senso econômico.
É isso aí, pessoal! O importante, é que esta página escura da nossa estória está sendo virada e as oportunidades daqui em diante serão muito expressivas! Afinal, há muito o que reconstruir! 🙂
Forte abraço!
Rogério Passos